domingo, 30 de abril de 2017

O Cristianismo é incompatível com a física quântica?


Para explicar de forma bem simples a física quântica (ou mecânica quântica, se preferir), vou pedir a você que imagine um jogo de basquete. Nesse esporte, há três tipos de cesta. Há a cesta de um ponto, a de dois pontos e a de três pontos, certo? Na medida em que as cestas são feitas, o placar vai aumentando, mas sempre de ponto em ponto, no mínimo. É verdade que se a cesta for da linha de três pontos, de uma só vez o placar aumentará três pontos. O que não é possível é que um jogador faça meio ponto, ou então 0,75 ponto, não é mesmo? Como o menor valor que o placar pode aumentar é de um ponto, podemos dizer que um ponto é o quantum da pontuação no basquete.

Mas como isso se aplica a física? Simples. Max Planck descobriu que, ao aquecer um material, a radiação que ele emite não cresce, digamos, de forma contínua. A radiação vai aumentando de pulo em pulo, vai aumentando como se fosse em pacotes de energia. A esses pacotes de energia, ele deu o nome de quantum.

Vimos o que quer dizer quantum, que obviamente dá origem ao termo “quântica”, mas você pode estar-se perguntando: sim, mas como isso virou física quântica? Bom, isso se deveu principalmente a outra pessoa: Niels Bohr.


O problema era que a forma como o átomo era entendido até então gerava muitos problemas na física. Ninguém sabia como os átomos se mantinham em atividade de forma tão estável, pois quando aplicávamos a teoria (em especial as equações de Maxwell) ao entendimento do mundo atômico, a teoria dizia que tal estabilidade não seria possível.

Bohr, então, teve a grande ideia. Já que nenhuma teoria que ele conhecia explicava adequadamente o funcionamento do átomo, ele pensou: que tal se nós aplicarmos o conceito quântico ao mundo atômico para ver o que acontece? De forma absolutamente impressionante, o conceito quântico aplicado ao mundo atômico começou produzir resultados que coincidiam com os obtidos pelos experimentos. Surgia, assim, o embrião do que chamamos de física quântica.

Vamos agora entrar na parte mais interessante da história: embora houvesse coincidência de resultados entre o que a nova teoria previa e o que se registrava na experiência, ninguém entendia por que o mundo atômico funcionava quanticamente; ou seja, ninguém entendia por que os elétrons ganhavam energia aos pacotes e não continuamente.

Para complicar a situação, Einstein reformulou o conceito de Newton de que a luz é partícula e disse que ela também funcionava em pacotes. Graças a isso, viu-se que, dependendo da experiência que nós fizéssemos, a luz funcionava ora como onda, ora como partícula. Como se não bastasse isso tudo, Broglie disse que esta característica da luz (ser onda ou partícula, dependendo da experiência) não é só dela, mas de todo o mundo atômico.

Isso é muito curioso, principalmente pelo fato de que onda e partícula são descrições que têm características que são contraditórias e, apesar disso, os mesmos elementos se comportavam de uma ou outra forma, a depender da experiência.

Não tendo como verdadeiramente compreender a realidade, a física simplesmente abriu mão da ideia de que, conhecendo todas as variáveis envolvidas, tudo pode ser determinado. A saída foi adotar uma visão probabilística das coisas. É neste contexto que Heisenberg cria o seu famoso Princípio da Incerteza. Este princípio diz que não é possível a gente determinar a posição e a velocidade (momentum, para ser mais técnico) de uma partícula subatômica ao mesmo tempo.

Pela primeira vez a incerteza ingressava na física não como a esperança de futura descoberta, mas como uma categoria científica. E as implicações foram muitas. Alguns, a exemplo do pessoal da escola de Copenhague, chegaram mesmo a dizer que a realidade somente tem certas características quando as medimos.

Para demonstrar o paradoxo do posicionamento da escola de Copenhague, Schrödinger cria um experimento hipotético em que um gato é fechado em uma caixa com um elemento radioativo que poderia ou não desencadear um processo que o mataria. Para os da Escola de Copenhague, aquele gato não estaria nem vivo nem morto até que verificássemos a experiência, o que é um pensamento absurdo.

Diante da enorme dificuldade de se entender o que a incerteza como elemento científico quer dizer exatamente sobre a realidade, alguns a atrelaram à causalidade, chegando ao ponto de negá-la. Diante disso, surgem colocações que tentam atacar a afirmativa de que Deus criou o mundo, de que Ele é a causa primeira de tudo o que existe.

A crítica mais corriqueira é a de que, como não há mais necessidade de causalidade, o universo não precisa de Deus para tê-lo criado. Assim como partículas subatômicas passam a existir aparentemente a partir do nada sem uma causa, o universo pode ter passado a existir a partir do nada sem uma causa.

Primeiramente, veja que as partículas que parecem passar a existir do nada no mundo subatômico não estavam exatamente no nada. Elas estavam em um campo de energia flutuante, que pode perfeitamente se transformar em certas partículas a depender da relação de causalidade que se estabelece naquele ambiente. É uma situação completamente diferente da que ocorreu na origem do universo, em que a própria física estabelece a criação a partir do nada (e não de energia existente).

Repetindo, a própria física estabelece que o universo foi criado a partir do nada, verdadeiramente. Partículas subatômicas passam a existir a partir de algo que já existe, que é a energia. O nada, conforme diria Aristóteles, é aquilo com que as pedras sonham. Energia é outra coisa bem diferente.

Em segundo lugar, é um grande erro afirmar que a física quântica extingue a necessidade de casualidade. Mesmo na física quântica, tudo o que vem a existir tem uma causa. Em outras palavras, a incerteza na física quântica não diz que se decretou o fim da causalidade, mas sim que pela ciência não temos como determinar exatamente qual foi a cadeia de causas do passado que fez com que um determinado elemento esteja em uma posição específica no presente.

O problema aqui não é com a causalidade, mas sim com o determinismo. Ou seja, com a ideia de que a ciência pode entender todas as relações de causalidade na natureza. A própria física quântica provou que a ciência é míope quando tentar entender o mundo na relação causa e efeito, o que não quer dizer que tudo o que venha a existir não tenha uma causa de sua existência.

Portanto, dizer que uma partícula surge a partir do nada e sem causa é um erro duplo: primeiro, porque a física quântica não nega a causalidade; segundo, porque ela não surge a partir do nada, mas sim de um ambiente de energia flutuante.

A física quântica, portanto, não é uma ameaça ao Cristianismo. Pelo contrário, ela até mostra que a ciência é incapaz de entender toda a relação causal que existe na realidade, embora não ataque a causalidade, o que abre margem ao entendimento de alguns conceitos cristãos.

Quero dizer, o princípio filosófico decorrente da física quântica inclusive nos ajuda a entender Deus e aponta para Ele. Veja que é exatamente o princípio que ocorre nos milagres, em que as relações de casualidades envolvidas no agir sobrenatural de Deus são incompreendidas pela ciência, mas, conforme a filosofia da física quântica indica, não podem ser negadas por ela. Ao físico quântico resta, em muitos casos, a compreensão da realidade por outro caminho: a fé.

Caso queira visitar a publicação original deste artigo no blog Raciocínio Cristão, clique aqui.
Deus abençoe,
Tassos Lycurgo é presidente do Ministério Internacional Defesa da Fé (defesadafe.org) e do Faith.College, pastor ordenado pelo RMAI (EUA), advogado (OAB/RN), professor da UFRN, professor do RBT College (Guatemala), professor convidado do RBT College (EUA) e professor visitante da Oral Roberts University (EUA, 2012-2015). É Pós-Doutor em Apologética Cristã (ORU, EUA) e em Sociologia Jurídica (UFPB), PhD em Educação – Matemática/Lógica (UFRN), Mestre em Filosofia Analítica (Sussex University, Inglaterra), Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho (UNIDERP), Graduado em Direito (URCA), Filosofia (UFRN), Liderança Avançada (Haggai Institute, Tailândia), Ministério Pastoral e Estudos Bíblicos (RBT College, EUA), tendo também estudado na Noruega.

0 comentários:

Postar um comentário

▲ TOPO DA PÁGINA