domingo, 10 de julho de 2016

Por que Tiago afirmou que uma pessoa é “justificada por obras” e não “por fé” somente? – Tiago 2:24




Com frequência, Tiago 2:14-26 é entendido como uma “correção” à ênfase dada por Paulo à justificação pela fé somente. Hoje, felizmente, a maioria dos estudiosos, assim como eu, não concorda com essa afirmação. Em primeiro lugar, ao procurar entender o argumento de Tiago, precisamos manter em mente o contexto geral e o objetivo de sua carta. Em segundo lugar, devemos compreender que diferentes escritores bíblicos podem, às vezes, usar a mesma terminologia para sentidos diferentes ou para um propósito específico. Pode depender também do contexto. (Leia Tiago 2:14-26 antes de continuar.)

1. Objetivo principal de Tiago: A mensagem de Tiago é muito simples em sua natureza, abordando os sofrimentos e provações da comunidade dos crentes e a opressão da estratificação social. Seu interesse foca o impacto social da fé cristã. Rejeita tratamento preferencial baseado em posses ou status social (Tiago 2:1-7) e condena a exploração social e o abuso dos pobres (Tiago 5:1-6). Para Tiago, a fé cristã não pode ser desconectada da sociedade, uma vez que ele afirma sua relevância. Sua mensagem teológica está embutida na preocupação de que a religião deve ser parte da essência da sociedade. Isso significa que tudo o que Tiago diz no capítulo 2:14-26 deve ser relacionado à sua maior ênfase.

2. Fé e obras: A passagem em consideração deve ser lida em seus próprios termos. Devemos determinar como Tiago usa a palavra “fé”. Contextualmente, isso não é difícil. Ele não a usa na forma salvífica tradicional, mas como conhecimento interior e convicção. Em outras palavras, o que depositamos em Cristo, inicialmente, não é fé, mas uma convicção religiosa que não determina a conduta. Isso se torna claro quando ele escreve: “Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios crêem e tremem” (verso 19). Fé é estar persuadido de que nossas convicções estão corretas; os demônios podem ter esse tipo de compreensão. Esse tipo de fé é inútil na vida cristã se ela nos conduz a uma atitude de indiferença em relação às necessidades dos outros (versos 14-16, 20). Tiago argumenta que a fé sem as obras é morta (verso 17).

De fato, alegar que a fé existe na ausência de obras equivale a afirmar que o corpo pode existir independente do espírito. Um não pode existir sem o outro. Fé e obras formam uma unidade indivisível na vida cristã (verso 26); as obras tornam visível a nossa fé (verso 18). São evidências da realidade da fé na vida do crente.

3. Fé e justificação: Sob a influência de Paulo, a justificação geralmente é vista como a absolvição dos pecados de pecadores arrependidos diante do tribunal divino, no início da vida cristã, independente das obras.

Tiago não está negando essa crença, mas também não está se referindo a esse assunto em particular. Ele escreve para membros da igreja, pessoas que já haviam sido justificadas pela fé em Cristo. O problema é que a fé que professavam não estava afetando o modo como deveriam viver a vida cristã. Para eles, Tiago diz: “A pessoa é justificada pelo que faz e não apenas pela fé”.

O elemento mais importante nesse verso é o verbo “justificar”. Uma vez que, no contexto, a presença da fé é comprovada ou demonstrada pelas obras, o verbo justificar provavelmente significa “mostrar ou demonstrar o que é ser justificado”.

O verbo exerce uma função demonstrativa, isto é, o crente mostra/demonstra que foi justificado não apenas por alegar que tem fé, mas especificamente pelo que faz. Essa foi a experiência de Abraão e Raabe, que demonstraram justificação por suas obras (verso 21 e 25). Essas não são as obras da lei pelas quais, segundo Paulo, alguns procuram ser justificados. Tiago está falando sobre o que Paulo chama de “boas obras”. Ambos concordariam que “somos feitura dEle, criados em Cristo Jesus para boas obras” (Efésios 2:10).

A mensagem de Tiago ecoa em Apocalipse 3:15-18 e nos desafia a permitir que nossa fé, pelo poder do Espírito, se expresse numa verdadeira conduta cristã e em profundo interesse pelos pobres e oprimidos. Afinal, “qual é o proveito, se alguém disser que tem fé, mas não tiver obras?” (Tiago 2:14).

Angel Manuel Rodríguez, Revista “Adventist World” – outubro de 2008

0 comentários:

Postar um comentário

▲ TOPO DA PÁGINA